Em comemoração ao 9º aniversário da Estação Conhecimento de Arari, vai ao ar semanalmente a série de matérias “Trajetórias que inspiram”, onde conheceremos a história de vida de jovens que passaram pela organização e hoje se destacam sendo protagonistas de sua própria trajetória.
A série começa com a história da jovem Marlene de Jesus, hoje com 22 anos, que ingressou em 2011 na EC Arari quando a organização ainda era focada no esporte de rendimento. Se destacava no treinamento de atletismo, mas também dividia sua rotina entre a capoeira e as diversas oficinas que eram oferecidas na época. Ela relembra o momento com um sorriso no rosto quando fala dos benefícios da Estação Conhecimento em sua vida, destacando as mudanças físicas trazidas pelo esporte, já que era uma criança com sobrepeso, e também dos ganhos nos estudos e nos vínculos sociais que o espaço oportunizou. Relembra que o sobrepeso era um dilema já que esse aspecto tinha forte impacto na concepção do esporte de rendimento adotada na época, então tendia a se sentir inferior por isso e até sofria com piadas de outras crianças, no entanto, o posicionamento dos educadores foi fundamental para mostrar seu potencial e levá-la a competir em provas importantes, comenta Marlene:
“O começo de tudo foi lá (na EC Arari). Nunca imaginei que eu fosse fazer esporte porque eu era gordinha, mas foi justamente fazendo atletismo que descobri que eu era capaz. Essa lição serviu para tudo na minha vida, pois me mostrou que não posso dar ouvidos para o que qualquer pessoa fala de mim, a minha confiança precisa vir de dentro”.
Marlene conta que sempre teve gosto diversificado e por isso aproveitava todas as oportunidades que apareciam através da EC. Foi assim que fez o curso de Doces e Salgados que lhe ajudou a descobrir uma nova habilidade – a culinária – e trouxe uma possibilidade de sustento em um momento crucial de sua história: a perda da mãe.
Próximo de completar seus 18 anos, Marlene estava em processo de desligamento da EC Arari, mas precisou se afastar antes do imaginado. Com o adoecimento da mãe, a adolescente de 17 anos, na época, precisou acompanhar o tratamento na capital e assim se afastou da escola e da Estação Conhecimento. Relata que só conseguiu concluir o ensino médio, pois a escola permitiu que estudasse à distância através de trabalhos, atividades e provas. Quanto a EC, conta que sentiu muita dificuldade ao precisar se afastar, pois gostava da correria do dia-a-dia, mas ainda distante sentiu-se apoiada pela organização, por meio do acompanhamento psicológico oferecido e também da presença constante dos fortes laços de amizade com atendidos e educadores que fez na época, fatores fundamentais no momento em que perde a mãe.
Foi também aproveitando as oportunidades na EC que Marlene aceitou fazer o curso de permacultura no Núcleo Produtivo anexo à EC Arari e através desta formação atuou por um ano, após sair da EC, como Agente comunitária de desenvolvimento do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD), onde orientava sua comunidade a respeito do cuidado com o lixo, com horta caseira e outras iniciativas sustentáveis. Nesta atividade também se destacava e por esse período conseguiu uma renda extra para a família, a essa altura comandada por ela – filha mais velha – e o pai.
Aos finais de semana, Marlene se dedicava a venda de salgados produzidos por ela depois do curso de Doces e salgados na EC Arari. Em um espaço comunitário próximo à praça e à igreja da comunidade de Escondido (Arari-MA), Marlene produzia e vendia cerca de 100 salgados por final de semana. Conta com satisfação que vendia todos muito rapidamente, conseguindo uma renda mensal satisfatória para a família. A notícia se espalhou pela comunidade e a clientela cresceu. Tudo fluía muito bem quando inesperadamente foi dispensada do espaço que utilizava para vendas e mais uma vez precisou encarar a adversidade e se reiventar: partiu para a venda online. Sem espaço para vender, atualmente a jovem continua a atender sua grande clientela através do Whatsapp, seu principal meio de encomendas hoje.
Ao ser indagada sobre uma lembrança especial com a EC Arari, Marlene conta que as formações que os educadores recebiam com grupos de treinadores de fora eram especiais tanto para os educadores, quanto para seus alunos, por serem momentos de trocas de afirmações positivas e motivação, onde ela sentia-se especial por se sair bem na modalidade. No entanto, conta que jamais esquecerá os “cinemas na comunidade” – evento promovido pela Estação onde reuniam-se na praça para assistir a filmes. Marlene relembra que quando esses eventos aconteciam em sua comunidade alavancavam as vendas de seus salgados.
“Lembro também que uma vez um professor chegou com uns cinco carros lotados de gente para comparem meus salgados. Ali eu pensei que ele realmente acreditava em mim, no que eu faço, pois teve coragem de trazer muitas pessoas para experimentar”.
Marlene contou que só consegue enxergar pontos positivos em sua passagem pela Estação Conhecimento de Arari e as palavras que ouviu e atitudes que presenciou dentro e fora da pista de corrida lhe serviram para tudo na vida. Após ter constituído sua família, o maior plano da jovem é conseguir investir em seu negócio, retomando um espaço bem localizado dentro de sua comunidade para continuar com suas vendas e seguir sendo inspiração para todos que conhecem sua trajetória.